segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Não tenha medo da morte!

Não precisa ter medo da morte, pois a morte não existe, seja de forma espiritual sendo que o corpo físico se transforma e nosso espírito continua normalmente em vida plena, ou mesmo por outros motivos. Por que ter medo do inevitável?

Devemos ter medo da morte?

Morte e Vida

"Vida só vida, vida sem sombra é visão utópica
projetada para além do mundo de
contradições, trabalho e guerra. Nessa utopia
não haveria mudanças nem fluxo, nem
trabalho. No extremo oposto teríamos o trabalho
que não se renova, a impiedosa
tarefa de Sisifo, vida sem lógica, sem Discurso.
O Discurso revela-se no transcurso. Negados
ambos os extremos, resta a vida-morte, vida
que se refaz, transcorre." (Shuller)

Nosso limite, nosso fim. De Heráclito - que afirmava que constantemente damos diferentes formas a nossas vidas, mas que a última forma nos é dada pelos vermes - a Heidegger - que nos apresenta como "um ser para a morte" nossa única certeza, nossa limitação e, paradoxalmente, nossa possibilidade de ser-no-mundo - a morte aparecem em suas diferentes faces e leituras como possibilidades de vida.

Se estamos vivos, caminhamos para a morte, morremos a cada instante, mas também cultivamos a vida, com substituições de nossas células, com renovações de nosso ser. O mesmo fruto, diz Heráclito, é sadio e podre, também não seríamos nós, ao mesmo tempo sadios e podres? Nossas organizações sociais nascem e morrem a cada dia, refazem-se, desfazem-se em novas formas, em colisão de idéias. Não há pleno sem a contradição, a divergência já anunciada por Heráclito é verificada diariamente. Se repetimos o mesmo, não há fluxo, não há vida.

"Quando morremos? na verdade, morremos todos os dias. Morte são também nossas decepções, nossos projetos falidos, nossas idéias abortadas. Morte é tudo oque nega a vida. A morte definitiva, a que encerra todos os atos, a que nos apresenta a vida concluida, dessa não podemos tratar porque ela não excede. Restam nos os insucessos que a anunciam, neles acenam os signos do que não nos é dado alcançar. Esperamos e conjeturamos. Como poderiamos, de outro modo, elevarmos acima da solidez dos corpos que nos cercam, assinalando lhes a precariedade?"(Shuller)

Quantas vezes morremos em vida? Quantos projetos abortados? Quantas decepções?
no primeiro momento a morte nos atinge, congela, impede. Mas assim que vivemos nosso luto, que choramos nossos sonhos mortos, nossa vida surge: novos planos, novas possibilidades, às vezes melhores que as anteriores. Quantas vezes se faz necessário que abortemos um projeto falido para darmos lugar a uma proposta mais condizente com as possibilidades reais? Quantas outras vezes necessitamos negar uma idéia para que outras possam surgir? Quantas vezes aqueles que nos contradiz e nos provoca a um abandono de um posicionamento fechado nos impulsiona, ao mesmo tempo, ao renascimento através de novas posições?

O problema é que tememos a morte, nos apavoramos diante dela, ao invés de vê-la como possibilidade de vida. Queremos somente a vida, o que é, como afirma Shuller, utopia. Não há vida sem morte, nem morte sem vida, poderiamos ficar com Epicuro que nos garante que não devemos temer a morte, porque enquanto estamos vivos ela não está presente, e quando ela está, nós é que não estamos.

"Então, o mais terrível de todos os males, a
morte, não siginifica nada para nós, justamente
porque, quando estamos vivos, é a morte que
não está presente; ao contrário, quando a
morte está presente, nós é que não estamos. A
morte, portanto, não é nada, nem para os
vivos, nem para os mortos, ja que para
aqueles ela não existe, ao passo que estes não
estão mais aqui. E, no entanto, a maioria das
ora foge da morte como se fosse
o maior dos males, ora a deseja como descanso
dos males da vida (Epicuro)

Apesar de inevitável, lutamos constantemente contra a limitação que nos é imposta. Buscamos todos os meios possíveis para preservar a vida. O desenvolvimento tecnológico, o investimento em medicamentos, as pesquisas sobre formas de ampliar os limites da vida são frequentes e buscados em larga escala na sociedade atual. Há quem aposte na construção dos ciborgues, considerando a mistura de silicio com material genético como ponto de partida para a imortalidade. Há quem defenda a possibilidade de um download de nossa consciência para uma máquina, permitindo assim a manutenção da vida em outro formato, em outro hardware, como por exemplo, "Kurzweil" em a Era das Máquinas Espirituais.

Mas nos preocupamos com outras formas de morte? Claude Levi-Strauss, em Antropologia estrutural, descreve algumas situações em socidades primitivas, onde os condenados a morte simbólica - ou seja, aqueles que por algum motivo foram condenados por suas sociedades a serem tratados como se não existissem, como se tivesse morrido, em pouco tempo morriam de fato.

Quanta morte há, então, na indiferença? afirma Buber, em "Eu e Tu", que o contrário do amor não é o ódio e sim a indiferença. A indiferença não provoca, exclui. Não discorda, anula. Impede a vida e mata. Diz Shuller "Há espaço comum quando a diferença não provoca a indiferença" No espaço comum construimos, ampliamos as margens do rio que é e não é o mesmo. O espaço comum propicia a morte do mesmo para o surgimento do novo, do eu que se constitui, junto-com-o-outro, daquele que sai do idiotismo e, em seu movimento, cria a vida.

Se buscamos a vida, tememos a morte, porque nos tornamos a cada dia mais ensimesmados? Por que constituimos uma socidade cada vez mais individualista? Por que tratamos o outro com indiferença? Qual a diferença que fazemos no mundo onde vivemos? Se morte e vida são complementares, se morremos a cada dia e isso nos permite renovação, qual a nossa renovação diária?

Na verdade nosso medo é profundo mas não tememos a morte, aquela morte última, mas tememos a vida do que a morte, por que já estamos mortos em vida se assim tanto medo temos!

Não temamos a morte pois perdemos tempo com isso não renovando a vida, e assim morremos em vida.